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Comidas portuguesas herdadas dos tempos da ocupação mourisca

a large city landscape

 

 

A identidade culinária de Portugal está repleta de referências à cozinha árabe. A presença dos mouros (habitantes muçulmanos do Magrebe) na Península Ibérica, entre os séculos VIII e XIV, influenciou a forma como vivemos e comemos em Portugal até hoje.

Vê-se esta influência muçulmana do Norte de África na estética de Lisboa, por exemplo, onde as fachadas dos edifícios ainda estão decoradas com azulejos. No que diz respeito aos nomes dos nossos bairros e regiões, sabemos que qualquer palavra que comece com al também vem daqueles dias, já que al significa o/a em árabe. O popular bairro lisboeta de Alfama, por exemplo, recebeu o nome de “os banhos” em homenagem às fontes de água que outrora existiam naquela parte da cidade.

 

a large room

 

No que diz respeito à alimentação, existem muitos pratos e métodos de cozinha considerados tradicionais em Portugal que são uma evolução das preparações que já existiam na região do Magrebe de onde vieram os novos colonizadores de Portugal no século VIII. Referimo-nos a métodos de preservação de alimentos, como a salmoura e a defumação. Ao nível das receitas, esta influência é palpável maioritariamente em forma de sopas, caldeiradas e ensopados, com exemplos notáveis ​​em particular no sul de Portugal, nas regiões do Alentejo e do Algarve, mas que se estende até às ilhas portuguesas dos Açores!

 

Estes são os exemplos mais notáveis ​​de comidas com influência mourisca que comemos em Portugal hoje em dia:

 

Açorda

Açorda

Esta sopa típica do Alentejo é um exemplo de comida rural herdada de séculos atrás, quando os mouros já faziam questão de preparar alimentos de formas simples mas que realçassem os vegetais sazonais e preservassem o seu valor nutritivo após a cozedura. 

A açorda consiste numa fatia grossa de pão no prato, mergulhada em caldo com alho e ervas como coentros ou poejo, na maioria das vezes completada com um ovo escalfado. O peixe, como o bacalhau ou o cação, também pode fazer parte da açorda, mas não necessariamente.

No livro de cozinha árabe Kitâb-al-tabîj, de cerca do século X, podemos encontrar a primeira referência à açorda, neste caso com a designação tarid que em árabe significa pão amassado com água quente. Mesmo etimologicamente, não há como negar as origens da açorda, uma vez que ath thurdâ em árabe significa pão embebido, que é literalmente o que é a açorda.

 

Cataplana

a person holding a plate of food on a table

Cataplana é tanto um utensílio de metal com forma de concha, como o nome da receita preparada dentro deste recipiente. Na verdade, este é um dos pratos mais populares do Algarve. Esta panela de alumínio consiste numa concha que pode ser selada nas laterais. Desta forma, os ingredientes colocados na cataplana são cozidos no próprio vapor e umidade, retendo não só todo o sabor, mas também o valor nutricional.

A nível internacional, a cataplana é por vezes referida como a tajine portuguesa, evidenciando a sua semelhança com o popular utensílio e prato marroquino. Embora tradicionalmente os tajines sejam feitos de argila, eles usam o mesmo tipo de processo de cozimento a vapor hermético que uma cataplana. Em ambos os casos, os pratos são cozinhados lentamente e a temperaturas baixas.

 

Cuscos

cuscos transmontanos

Mesmo chegando até o norte de Portugal, até a região de Trás-os-Montes, ainda dá para sentir a influência árabe. Aqui, embora não seja tão popular quanto décadas atrás, encontramos os cuscos como parte da dieta regional. Normalmente feitas com uma variedade local de trigo chamado Barbela, estas pequenas pepitas de cereal são fruto de um trabalho intensivo e um primo português muito óbvio do couscous maghebriano. Transformar o trigo em minúsculos flocos de cuscos foi uma forma de conservar o cereal durante todo o ano, pois os cuscos são pré-cozidos, o que os torna muito mais duradouros.

É interessante ver como os cuscos se tornaram um alimento básico em Trás-os-Montes, uma região onde os mouros nunca chegaram. Acredita-se que, na verdade, foram os judeus que levaram consigo muitas das tradições do Magrebe e da Andaluzia, que importaram os cuscos e outros hábitos para esta região norte, enquanto buscavam refúgio da perseguição religiosa nesta área montanhosa mais isolada de Portugal .

Os cuscos em Trás-os-Montes são tipicamente confeccionados quase como um risoto, em preparações bastante molhadinhas, com couves ou cogumelos. Podem ser utilizados como acompanhamento de pratos de carne e peixe ou também para engrossar sopas e até em sobremesas!

 

Escabeche

escabeche

O escabeche é um molho típico comum em Portugal e Espanha, herdado dos tempos da ocupação muçulmana na Península Ibérica. Escabeche deriva de al-sikbaj, um molho agridoce com vinagre e mel.

Com uma quantidade considerável de vinagre, o molho de escabeche é usado com peixes como a sardinha e a cavala, não só para influenciar o sabor e a textura do peixe, mas também como forma de conservá-los por mais tempo. Além do vinagre, os outros ingredientes básicos para fazer o escabeche são cebola cortada em rodelas finas, alho, louro, tomate e azeite. Na verdade, mesmo o uso generalizado do azeite em Portugal remonta aos dias da ocupação muçulmana há cerca de 1000 anos, quando o al-zayt já era a gordura de eleição para cozinhar, moldando definitivamente a base da cozinha mediterrânea como a conhecemos hoje em dia.

 

Aletria

aletria

Aletria é uma das sobremesas de Natal mais típicas de Portugal e vem do clássico árabe iṭriyah, que simplesmente se refere ao macarrão fino com que se faz este pudim. Em português, aletria também se refere literalmente à massa aletria, que pode ser usada tanto em preparações doces quanto salgadas, mas que sem dúvida se popularizou com esta sobremesa e se tornou sinónimo dela. 

A primeira receita de aletria data do século VIII e pode ser encontrada no manuscrito de O Llibre de Sent Soví, que consistia numa compilação de cerca de 200 receitas.

Como sobremesa, a aletria usa macarrão de cabelo de anjo cozido numa mistura aromática de leite, açúcar, gemas de ovo e aromatizantes como canela e casca de limão. É o tipo de sobremesa que dificilmente se encontra nos menus dos restaurantes portugueses, mas que é extremamente comum em casa, principalmente na época do Natal.

 

Alconomias

a close up of food

Com base no seu nome, forma e ingredientes incluídos na receita, é fácil concluir que as alconomias são um exemplo comestível da herança mourisca em Portugal. Este doce típico do Alentejo é feito com farinha de trigo torrado, mel e pinhão, e tem a forma de um diamante. O nome alconomia significa cor de cominho em árabe, embora os cominhos não façam parte da receita – a cor acastanhada simplesmente deriva da tostagem da farinha.

As alconomias não são o tipo de doce português que normalmente se encontra nas pastelarias. Em vez disso, são vendidos principalmente durante festejos e feiras específicas, especialmente durante o Festival de Santo André, no final de novembro.

 

 

Alfenim

Alfenim Açores

Alfenim é um doce feito com açúcar, água e vinagre. É uma receita bem antiga que originalmente era conhecida em árabe como al-fenid, que significava o branco, o alvo. 

Introduzido em Portugal e na Espanha pelos mouros, o alfenim acabou por ser exportado para o Brasil pelos portugueses e para o México pelos espanhóis. No caminho de travessia do Atlântico, os Açores também receberam esta doce tradição, e é precisamente no arquipélago português que ainda hoje encontramos alfenim: nas ilhas da Terceira e da Graciosa a tradição ainda vive. Aqui poderá ver e saborear alfenim com formas verdadeiramente interessantes, representando flores, animais e muito mais, usadas ​​para os prazeres da degustação, mas também como ofertas religiosas durante o festival do Espírito Santo.

A influência árabe na maneira como comemos hoje não se reduz apenas a pratos e receitas. O amplo uso de certas especiarias e aromáticas (como cravo, açafrão e coentro), ingredientes (alfarroba, amêndoas, figos, frutas cítricas) e doces (frutas cristalizadas, mel, xaropes) não seria o mesmo hoje sem esta influência. Para além das refeições principais, os mouros gostavam muito de doces e sobremesas, particularidade que podemos facilmente observar que os portugueses não tiveram dificuldade em manter!

 

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